Existem muitos mitos sobre a alimentação vegana, mas a verdade é que ela pode trazer inúmeros benefícios quando bem estruturada e solidificada em um planejamento com alimentos variados e o mais natural possível. “E esse tipo de dieta também pode trazer benefícios aos rins. Uma alimentação baseada em verduras, legumes e grãos está associada à diminuição de fatores de risco relacionados à doença renal. Isso acontece porque há um maior aporte de fibras e antioxidantes na alimentação. Esses nutrientes ajudam o corpo contra componentes inflamatórios e estresse oxidativo. Além disso, a alimentação vegana reduz o risco de hipertensão, diabetes tipo 2 e síndrome metabólica – três problemas que são altamente relacionados com doenças renais”, explica a médica nefrologista Dra. Caroline Reigada, especialista em Medicina Intensiva pela Associação de Medicina Intensiva Brasileira.
De acordo com a médica, muitos estudos demonstraram que há redução de valores de pressão sistólica (até cerca de 5 mmHg) e diastólica (até cerca de 3 mmHg) com a adoção de uma alimentação baseada em vegetais. “Essa relação pode ser explicada pela redução de peso promovida na dieta vegetariana, já que a pressão arterial é sabidamente associada ao peso. Devemos sempre lembrar que a pressão alta é a principal causa de insuficiência renal”, diz a médica nefrologista. Além disso, existem outros mecanismos que relacionam a alimentação vegana a benefícios de redução de pressão. “A ingestão de mais potássio dos vegetais tem efeitos diuréticos; as fibras alimentares melhoram a sensibilidade à insulina e a absorção intestinal de magnésio; e maior ingestão de carboidratos complexos, o que está associado a uma melhora do perfil lipídico”, diz a médica.
Outra boa consequência da adoção da alimentação vegana (quando é natural e variada) é a maior sensibilidade à insulina. Segundo estudos, indivíduos que seguem essas dietas têm menos de 50% de chance de desenvolver diabetes se comparado aos não-vegetarianos. “A explicação pode ser o baixo índice glicêmico de grãos integrais e legumes. Esse efeito é potencializado quando a dieta está associada à atividade física, implicando inclusive na diminuição do uso de hipoglicemiantes orais para quem já é diabético e dos valores de glicemia de jejum. Vale ressaltar o menor impacto na hemodinâmica renal das proteínas vegetais se comparado às animais, ao diminuir a hiperfiltração renal, a proteinúria e, em tese, o risco de desenvolver insuficiência renal a longo prazo”, diz Dra. Caroline. A síndrome metabólica, um fator de risco independente para o desenvolvimento de doença renal crônica, também pode ser reduzida em cerca de duas vezes na prevalência ou risco mediante adoção de uma alimentação vegana.
A médica ainda destaca que a dieta a base de vegetais pode ser especificamente interessante para pessoas que já sofrem com a doença renal crônica. Isso porque esses pacientes apresentam mudança na microbiota, implicando em várias mudanças na fermentação bacteriana e na geração de proteínas tóxicas. “Estas proteínas tóxicas se acumulam no plasma dos pacientes, contribuindo para a síndrome urêmica e, como efeito na progressão da doença renal, em mediadores pró-inflamatórios e estresse oxidativo, no risco cardiovascular e na resistência à insulina. Foi demonstrado que a produção desses solutos é influenciada por modificações nos hábitos alimentares, uma vez que a alimentação vegana é rica em fibras não digeríveis e pode reduzir em cerca de 60% a excreção urinária dessas proteínas tóxicas”, explica a médica. “Vale destacar também que pacientes com doença renal crônica são inflamados cronicamente. O consumo maior de fibras e antioxidantes presentes em frutas e vegetais agem de forma importante para melhora da microbiota intestinal com efeito antioxidante e anti-inflamatório”, acrescenta a médica. “Sabemos que o estresse oxidativo está relacionado à progressão da lesão renal, das complicações cardiovasculares e das maiores taxas de mortalidade. Os veganos podem ter, a longo prazo, melhor status antioxidante com o maior consumo de frutas e vegetais, que contêm fitoquímicos, poderosos antioxidantes, impedindo a geração de radicais livres”, destaca a Dra. Caroline.
A médica enfatiza que esses benefícios também podem ser experimentados por pacientes não-veganos, mas que optam pela redução do consumo de carne e, principalmente, pelo aumento da ingestão de alimentos naturais, especificamente frutas, verduras e legumes. A médica ressalta que esse tipo de benefício não se aplica àqueles pacientes que mantêm um alto consumo de alimentos ultraprocessados, principalmente os ricos em sódio e aditivos químicos alimentares, que estão relacionados à inflamação.
Dra. Caroline Reigada é médica nefrologista formada pela Faculdade de Medicina da Universidade de Santo Amaro com residência médica na Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo e residência em Nefrologia no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Especialista em Medicina Intensiva pela Associação de Medicina Intensiva Brasileira, a médica participa periodicamente de cursos e congressos além de ter publicado uma série de trabalhos científicos premiados. Participou do curso “The Brigham Renal Board Review Course” em Harvard. Integra o corpo clínico de hospitais como São Luiz, Beneficência Portuguesa de São Paulo e Hospital Alemão Oswaldo Cruz.